Não sabia muito, talvez não
saiba até agora, como falar aqui no blog sobre o livro A mística feminina, escrito pela Betty Friedan e publicado,
originalmente, em 1963; mesmo assim resolvi escrever porque acredito na ajuda,
digamos, coletiva que esse livro pode oferecer a muitas mulheres (E, por que
não, a muitos homens?) que sentem o peso que as “funções femininas” trouxeram e
trazem!
Durante essa leitura me lembrei
de muitas mulheres (E também de mim mesma – risos.)... Mulheres comuns, do meu
círculo social, de várias classes sociais e com diferentes estados civis. Foi
incrível como consegui, de certa forma, aplicar todos os temas ao dia a dia,
sabe? Afinal, quem não conhece uma mulher que já teve o “problema sem nome”?
Aquele peso sobre a vida que não sabe de onde vem? O vazio que nenhuma
quantidade de filhos vai preencher? É sobre isso que essa publicação da editora Rosa dos Tempos trata!
[...] desde o fim da Segunda Guerra Mundial [...] Havia uma estranha discrepância entre a realidade de nossa vida como mulheres e a imagem à qual tentávamos nos adequar, imagem que passei a chamar de mística feminina.
Friedan escreve sobre as
mulheres estadunidenses das décadas de 1950 e 1960 mas, sincera e infelizmente,
suas pesquisas podem abranger mulheres do mundo todo, porque essas pesquisas
tratam sobre a insatisfação com a vida como “esposa e dona de casa” e, as mulheres
tinham vergonha de falar, tinham vergonha de admitir essa insatisfação.
Tinha tanta vergonha em admitir sua insatisfação que não fazia ideia de quantas outras mulheres compartilhavam dela. [...] as estadunidenses tiveram mais dificuldade de falar disso do que sobre sexo.
Essa insatisfação se estendia
para sintomas físicos, como sensação de cansaço, por exemplo. Mulheres com
filhos, trabalhos domésticos em excesso, solidão, tarefas maternas... Todas
elas com os mesmos sintomas do “mal da
dona de casa”.
A maioria [das mulheres] se ajustava ao seu papel e sofria ou ignorava o problema sem nome. Pode ser menos doloroso, para uma mulher, não ouvir aquela voz estranha e insatisfeita se agitando dentro dela.
É uma voz que grita por mais
realizações, mais feitos, mais reconhecimentos... Aquela vida que a sociedade
impôs a ela já não é suficiente, e esta insuficiência, além de causar desconforto,
pesa nos ombros das mulheres que não se veem encaixadas nas funções impostas
pela sociedade que, há muitas décadas, age de maneira machista e segregadora.
Mas essa voz, ainda que grite em prol da mulher, incomoda, machuca e,
principalmente, a culpa.
E, em sua vergonha e culpa, elas se voltaram novamente para os filhos a fim de escapar do problema. Então o círculo se completa, da mãe para os filhos e filhas, geração após geração.
Essa voz culpa mulheres que
não se contentam “apenas” com as realizações domésticas; as mulheres que
almejam (mais) autonomia, realizações profissionais (além das maternais e
matrimoniais). Mas Betty Friedan caminha para muito além do que já mencionei
até aqui. Suas pesquisas de campo e suas referências bibliográficas ampliaram
ainda mais meus saberes sobre reprodução social, incentivo exacerbado ao
consumo, desvalorização da mão de obra e da força intelectual feminina... Tudo
isso, claro, em benefício do excesso de consumo e da (Cof! Cof!) modernidade!
Nos impassíveis termos dele [Dr. Ernest Dichter], este que era o mais útil dos persuasores disfarçados me mostrou qual era a função de manter as mulheres estadunidenses como donas de casa – o reservatório que a falta de identidade, falta de propósito, cria para ser transformado em dólares no momento da compra.
A infinidade de produtos de
limpeza e eletrodomésticos que agilizam os trabalhos domésticos... Todos eles pensados
para a “esposa e dona de casa”! Todos eles pensados a partir do vazio e da
culpa que a mulher carrega por não se sentir satisfeita com o rumo que a vida
tomou.
‘Senhores, proponho, para o interesse de todos, darmos início a uma campanha coordenada de 50 bilhões de dólares para interromper esse perigoso movimento das mulheres estadunidenses fora de casa. Precisamos mantê-las como esposas e donas de casa; não podemos esquecer disso.’
E eu poderia ficar aqui citando
inúmeros temas abordados pela autora, com muito respaldo científico e
histórico, mas “finalizarei” falando sobre um capítulo intitulado “Desumanização progressiva: o campo de
concentração confortável”. Baseada no livro de Bruno Betelheim (O coração informado – Autonomia na era da
massificação; Paz e Terra; 1985), Friedan faz uma analogia entre a situação
de prisioneiros dos campos de concentração e a situação da mulher que está presa a uma vida de insatisfação,
culpa, manipulação e imposição.
Eram manipulados para se manterem presos [os prisioneiros dos campos de concentração]; eles se aprisionavam ao tornar o campo de concentração o mundo todo, negando o mundo amplo do passado, a responsabilidade do presente e as possibilidades do futuro.
[...] Mas será a casa dela, na verdade, um campo de concentração confortável? As mulheres que vivem na imagem da mística feminina não se aprisionaram entre as estreitas paredes de seu lar?
É de fato extremamente difícil para um ser humano sustentar tamanha divisão ‘interna’: conformar-se externamente com uma realidade, enquanto tenta manter internamente os valores que ela nega. O campo de concentração confortável para o qual as mulheres estadunidenses caminharam ou foram persuadidas a entrar é tão somente uma realidade dessas, um modelo que nega a identidade humana adulta da mulher. [...]
Pra mim esse capítulo foi o
que melhor enfatizou a força e a importância da mulher dentro da sociedade. Mas
o que mais me impressionou foi que os assuntos não são apenas sobre o passado,
mas também sobre o nosso presente e futuro! Casamentos utilizados como
contratos, reprodução social, trabalho doméstico não remunerado, subjugação da
mulher, manipulação, menosprezo por habilidades intelectuais femininas...
Foi um livro que me trouxe
revolta mas, principalmente, me trouxe muita vontade de lutar e ajudar muitas
mulheres. E foi “só” pra isso que escrevi e publiquei este texto: pra dar
continuidade a uma das intenções deste blog, que é fazer com que o livro seja
objeto de transformação na vida do maior número de pessoas possível!
[...] É mais fácil viver com o marido e os filhos do que abrir seu próprio caminho no mundo. [...] E a liberdade é uma coisa assustadora. É assustador enfim crescer e se libertar da dependência passiva. Por que uma mulher deveria se preocupar em ser algo além de esposa e mãe se todas as forças de sua cultura lhe dizem que ela não precisa crescer e que será melhor assim?
Mesmo que você, leitor deste
texto, não se encaixe em nenhuma situação mencionada aqui no blog e/ou no
contexto do livro da Betty Friedan, é importante que você o leia, para que você
consiga ajudar mulheres e homens que vivem à sombra da “mística feminina”!
MULHERES DO MUNDO, UNI-VOS!
Ficha técnica
Título original: The Feminine Mystique
Título brasileiro: A mística feminina
Autor: Betty Friedan
Tradução: Flávia Yacuban
Design e ilustração de capa: Juliana Misumi
Com carinho, Cotovia Literária!
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