Pular para o conteúdo principal

Queria ter ficado mais (Não! Não é sobre a (bela) "Epitáfio"!)


O livro Queria ter ficado mais é uma daquelas publicações que me encantam logo de cara, por conta do projeto gráfico. Nesse caso, isso aconteceu (também) porque ele traz todas as características básicas de um livro, digamos, tradicional, mas foi publicado em formato de cartas, dispostos em envelopes lindos e (originalmente ilustrados com aquarela, por Eva Uviedo)Tudo isso com a intenção de simbolizar cartas enviadas, de longe, pelas autoras. As ilustrações são baseadas nas narrativas de cada uma delas, de forma a parecer o “caderninho delas”, e mostram ao leitor os lugares visitados, antes mesmo do início da leitura.

Esse livro, dividido em 12 capítulos não sequenciais, é um compilado de relatos sobre algumas viagens feitas pelas autoras, que foram escritos com a intenção de não serem transformados em apenas mais um livro de viagens e/ou um guia turístico convencional, mas sim,

[...] que os lugares fossem se revelando, conforme avançassem as histórias, ou seja, Como é viajar através dos olhos de uma mulher?,

como explica a organizadora do projeto (e uma das autoras), Cecilia Arbolave.

As autoras se veem diante de muitos personagens, vão descobrindo o que ouvir das pessoas durante suas experiências turísticas e tentam (Com sucesso, posso afirmar.) fazer com que isso chegue ao leitor. Pra isso, elas fogem dos relatos sobre visitas a pontos turísticos óbvios, mostrando que não há um estilo de escrita típico e estereotipadamente feminino, mas sim, diferentes olhares sobre os lugares visitados, o que acaba criando estilos diferentes de escrita, independentemente de ser feminino ou não.

Achei incrível como algumas descrições pareceram fazer com que eu sentisse o quentinho do sol da manhã italiana, o frescor da margem do rio Sena e vivesse a beleza do amanhecer de Yangshuo! São vários relatos com intensidades e abordagens diferentes sobre 12 países. A doçura de uma, não é vista na eloquência de outra; tão pouco o mistério de um romance no Japão pode ser lido na descrição de passagens pelo Oriente Médio! Pra você, leitor deste blog, minhas palavras podem beirar a obviedade, mas quando você tiver a experiência de ler e manusear esse livro lindo, que algumas pessoas que conheço chamam de “O livro das cartas”, você entenderá minha necessidade de pontuar aqui essas diferenças!

E apesar de toda minha descrição (verdadeiramente) entusiasmada, a experiência de leitura desse livro, publicado pela editora paulistana Lote 42, não fica “apenas” a cargo das narrativas... ao leitor que se permitir ver o livro (também) como objeto, essa publicação oferece ainda a experiência do manuseio das cartas, dos envelopes, da cinta que os prende firmemente... guardar as cartas de volta nos envelopes me proporcionou a sensação de fazer parte, de certo modo, de cada história que ia lendo; além disso, pra mim foi bem surpreendente a ideia de que ainda posso enviar e receber cartas! Foi estranho ter esta constatação, mesmo sabendo que existem envelopes, papel, caneta, agência dos Correios e selos. Às vezes, isso me parece um pouco distante!

São 12 estilos de texto diferentes e cada um, à sua maneira, conquistou meu coração e despertou meu interesse pelos lugares visitados e descritos com tanto carinho, saudade e intensidade. Lugares que nunca tive vontade de visitar, como Nova York, por exemplo, despertaram minha curiosidade, e entraram na “minha lista de vontades”, porque as autoras realmente foram muito incríveis com a descrição vívida de restaurantes, bairros, livrarias, até casas noturnas e repúblicas estudantis. Um deleite pra mim, que gosto de viajar mas não sou a louca das agências de turismo, e mais ainda pra quem vive com o pé na estrada!
Divirta-se e permita-se, lendo as boas histórias que o Queria ter ficado mais traz dentro de seus elegantes, lindos e ricos envelopes.

Não posso deixar de aproveitar esse finalzinho de texto pra sugerir, fortemente, que você, apaixonado por livros como eu, conheça todo o catálogo dessa editora incrível que é a Lote 42.

Ficha técnica:
Título: Queria ter ficado mais
Organização: Cecilia Arbolave
Ilustrações: Eva Uviedo
Editora: Lote 42

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Os machões dançaram (E bem mal, hein?!)

Mulher é minha causa. Mulher é meu dogma. Mulher sempre foi minha cachaça e meu comunismozinho.   No livro final da trilogia “Modos de macho & modinhas de fêmea” Xico Sá publica crônicas inéditas e também crônicas já reproduzidas no jornal El País e Folha de São Paulo. São crônicas sobre amor e sexo, que a maioria das pessoas podem julgar terem sido escritas para o público feminino. Mas se o público masculino se aventurasse nas leituras dessas crônicas, teriam muito a aprender, hein?!   O livro é uma afronta ao machismo e uma apologia à liberdade de amar, à sensibilidade e, principalmente, à mulher! Não, não é a sensibilidade de chorar por tudo, de mimimi… é sensibilidade no olhar, no tocar, no não tocar...   Em uma das primeiras crônicas, ele elogia Clint Eastwood (Quando a foto foi publicada, em 2012, o ator tinha 82 anos.), por recusar o uso de photoshop em sua foto na capa da revista “M” (Suplemento do jornal francês “Le Monde”). Na mesma crônica, ele menciona a

a bruxa e o espantalho (Que belezura!)

Costumo dizer que investir em um livro de imagem é uma excelente ideia, porque esse tipo de livro é infinito. Principalmente se o leitor for uma criança, porque a cada vez que a história for lida pela criança ou contada pra ela, a história será recebida por uma perspectiva diferente. Mais ou menos como quando relemos um livro e, após cada releitura, fazemos uma interpretação diferente dele. A bruxa e o espantalho é um livro de imagem, com capa dura, relativamente barato, traz as espetaculares ilustrações do artista mexicano Gabriel Pacheco  e que foi  publicado no Brasil pela Editora Jujuba .  As ilustrações de Gabriel Pacheco narram a história de uma bruxa que voava em “bando” com outras bruxas (Assim como as aves!) utilizando seu monociclo, enquanto as outras bruxas utilizavam suas vassouras. Mas em algum momento da viagem, essa bruxa diferentona se distrai com um passarinho, cai do seu meio de transporte diferentão e, além de ser duramente criticada, é excluída do bando

“Mas e eu? Quem vai cuidar de mim?” Ah... Nisso eu não tinha pensado!

Acredito que o (para)texto da quarta capa do livro Ah... nisso eu não tinha pensado! foi bem econômico ao dizer que a narrativa e as imagens falam “apenas” sobre solidariedade... acreditem senhoras e senhores! Esse livro vai muito além de solidariedade! A história começa com a descrição de uma cidade devorada por concreto e asfalto, e que antecede a história de um velhinho, morador de uma casa que é antiga e acolhedora, para os padrões das construções ao redor dela; com duas cerejeiras no quintal, um grilo morando perto da lareira e uma entrada sem muros e grades, sua casa ocupava um lugar desejado por uma grande construtora, que já o havia notificado sobre a desapropriação e também sobre o despejo. Mas mesmo que construtora tivesse prometido a ele um lugar adequado para morar, o velhinho estava muito triste, porque para ele, o lugar adequado era a casa dele! Ele a tinha construído, lá tinha vivido com sua mulher e seus filhos, lá guardava todas as suas lembranças...